Fornecimento de energia em Roraima sofre com distúrbios em importação da Venezuela
Por Leticia Fucuchima e Rodrigo Viga Gaier
SÃO PAULO/RIO DE JANEIRO (Reuters) - O retorno das importações de energia elétrica da Venezuela tem provocado distúrbios no sistema de Roraima nos últimos meses, com apagões e dezenas de cortes automáticos de carga, devido a deficiências da linha de transmissão que conecta os países, segundo dados do operador do sistema elétrico e pessoas consultadas pela Reuters.
As importações estão autorizadas até junho, e sua permanência deverá ser avaliada pelo governo nos próximos meses, enquanto avançam as obras que finalmente conectarão Roraima ao Sistema Interligado Nacional (SIN).
Depois de quase seis anos, o Brasil voltou a importar energia da Venezuela em fevereiro, em medida para reduzir custos e diversificar o suprimento de Roraima -- único Estado que não recebe energia da rede elétrica nacional, o que torna a prestação dos serviços mais precária.
A energia aos consumidores de Roraima é fornecida principalmente por termelétricas locais, em operação cara e com combustível subsidiado por encargo cobrado nas contas de luz. A importação só é realizada se resultar em economia em relação ao custo de acionamento dessas usinas.
Desde fevereiro, a linha de transmissão que conecta Brasil e Venezuela registrou dezenas de desligamentos, enquanto Roraima enfrentou pelo menos dois apagões, sendo que o mais recente ocorreu no sábado ado, conforme dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).
O apagão de sábado, cujas causas ainda estão sendo investigadas, durou cerca de 3 horas, com interrupção de 207 megawatts (MW) de carga. Houve desligamentos da linha venezuelana, da termelétrica Jaguatirica II e de demais unidades geradoras e equipamentos do sistema Roraima.
Um balanço apresentado pelo ONS ao Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), com dados até abril, aponta 38 desligamentos da linha de transmissão Brasil-Venezuela em menos de dois meses.
Foram 36 desligamentos forçados devido à atuação de proteções em resposta a perturbações no sistema venezuelano. Dezenove deles resultaram em corte de carga para Roraima.
O ONS relatou frequentes interrupções no sistema da Venezuela "por colapso de tensão". Outra dificuldade associada à importação de energia foi o aumento de "variações bruscas de potência" na termelétrica Jaguatirica II, em resposta às perturbações no sistema, apontou o órgão.
Não foi possível falar imediatamente com um representante do setor elétrico na Venezuela.
Uma fonte com conhecimento do assunto ponderou que, apesar dos problemas, a importação de energia da Venezuela tem ajudado a mitigar blecautes que ocorreriam devido a problemas próprios das termelétricas de Roraima.
De fevereiro a abril, a usina Jaguatirica II registrou cinco perturbações que teriam levado a blecautes aos consumidores se não houvesse o fornecimento de energia da Venezuela, de acordo com o ONS.
"(Manter a importação) É um 'trade-off' difícil de avaliar exclusivamente sob a ótica da operação", disse a fonte.
Já para a distribuidora Roraima Energia, o retorno das importações da Venezuela não provocou nenhum problema adicional, disse Gustavo De Marchi, presidente do conselho de istração da concessionária.
"Nada crônico... Não teve nada que tenha fugido da normalidade", disse ele, lembrando que a distribuidora já enfrenta uma operação mais precária e desafiadora devido ao fato de o Estado estar desconectado do SIN.
O governo brasileiro autorizou a comercializadora Bolt a realizar importações de energia venezuelana, no limite de 15 MW, a um preço de R$1.096,11 por megawatt-hora (MWh).
A autorização da Bolt ficará válida até junho, e as operações poderão ser suspensas "a qualquer momento" se o desempenho elétrico da interligação entre os países for considerado insuficiente, conforme decisão do CMSE.
A expectativa também é de que Roraima seja finalmente interligada à rede elétrica nacional neste ano, com a conclusão das obras do linhão Manaus-Boa Vista. Licitado em 2011, o projeto da Transnorte Energia, consórcio entre Eletrobras e Alupar, enfrentou várias dificuldades para sair do papel, associadas principalmente aos impactos à comunidade indígena Waimiri Atroari.
"Isso mudará completamente a vida e a realidade da Roraima, que até então era 100% isolada", destacou De Marchi.
As obras de conexão de Roraima ao SIN estão em fase final e devem ser concluídas em agosto de 2025, apontou o ONS.
(Por Letícia Fucuchima em São Paulo e Rodrigo Viga Gaier no Rio de Janeiro)