Almirante nega ter visto minuta do golpe, mas ite reunião com Bolsonaro
O almirante Almir Garnier, ex-comandante da Marinha, disse hoje ao ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes não ter visto documento sobre a tentativa de golpe de Estado e negou ter colocado tropas à disposição de Jair Bolsonaro.
O que aconteceu
Reunião com Bolsonaro. Ao ser questionado por Moraes sobre reuniões que fazia com o ex-presidente, Garnier itiu um encontro no dia 7 e 14 de dezembro — este último, segundo ele, se encerrou rapidamente. "Nesses períodos finais, nos reunimos mais vezes. Isso era quase rotineiro. Assuntos diversos eram tratados nessas reuniões."
Cúpula militar presente. Na reunião de 14 de dezembro, estavam presentes, além de Garnier e Bolsonaro, o então ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira e os comandantes do Exército, Freire Gomes, e da Aeronáutica, Baptista Jr.
Garnier disse que "não houve apresentação de documento durante a reunião". "O senhor me perguntou se houve apresentação [durante a reunião com ex-presidente], eu não lembro de ter sido apresentado nenhum documento. Senhor ministro, essa reunião foi, para dizer o mínimo, estranha. Estranha porque ela meio que se encerrou antes."
Ex-comandante da Marinha disse que houve algum "desentendimento" antes de sua chegada à reunião. Segundo Garnier, quando chegou ao encontro do dia 14 de dezembro, ele percebeu que tinha havido algum tipo de desentendimento ou "alguma discussão anterior tinha acontecido". "O ministro não abriu nenhuma pauta adicional. Parecia estar chateado com o desenrolar da conversa e a reunião foi encerrada", disse ele.
Documento golpista. Moraes leu, na sequência, um trecho com depoimento do brigadeiro Baptista Júnior sobre a reunião e a possível existência de um documento golpista. O ex-comandante da Marinha relatou a Moraes que o general Paulo Sérgio apresentou um documento no dia 14 para que fosse analisado pelos presentes. "E eu confesso ao senhor que não me lembro se ele falou que era um estado de defesa ou um estado de sítio", disse Baptista Júnior no depoimento lido por Moraes.
Garnier disse não se lembrar do depoimento lido por Moraes. "Não me lembro desse trecho. Eu me lembro que as pessoas estavam com aquela cara de que comemos e não gostamos. Alguma coisa me lembro. É, já tinha acontecido, mas eu não vi documento, não foi apresentado documento, eu não vi o general, eu não vi o Brigadeiro Batista Júnior dizer isso."
Não vi minuta, diz almirante sobre reunião do dia 7
Moraes questionou Garnier sobre reunião do dia 7 de dezembro. Nela, Garnier disse que foram discutidas "medidas da lei e da ordem". Segundo a denúncia da PGR, nessa Bolsonaro discutiu uma minuta de decreto golpista com os comandantes do Exército e da Marinha.
Almirante diz que assunto da reunião do dia 7 era segurança. Nessa reunião, bom, havia vários assuntos, dentre os quais, o principal era a preocupação que o presidente tinha das inúmeras pessoas que estavam, digamos assim, insatisfeitas e se posicionavam no Brasil todo, normalmente em frente aos quartéis do Exército, e aquilo poderia trazer alguma dificuldade para a segurança pública, não se sabia muito bem para onde ia aquele movimento."
Discussão sobre GLO em reunião, segundo Garnier. "Houve uma apresentação de alguns tópicos de considerações que poderiam levar à decretação de uma GLO ou de necessidades adicionais, principalmente visando a segurança pública", disse ele. "Eu não vi minuta, ministro. Eu vi uma apresentação na tela de um computador. Havia um telão, onde algumas informações eram apresentadas na tela."
PGR diz que Garnier ofereceu tropas a Bolsonaro
Garnier foi chefe da Marinha entre abril de 2021 e dezembro de 2022. Segundo a denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República), ele teria aderido à proposta golpista e dito a Bolsonaro que sua tropa estava à disposição do ex-presidente.
Garnier negou ter colocado tropas à disposição. A pergunta do ministro citou trechos de falas do general Freire Gomes, que teria dito em depoimento que o almirante teria sido o único que colocaria as tropas à disposição no contexto de um estado de exceção e decretação de GLO. Mas, Garnier disse que isso não ocorreu.
Almirante ou a ser enaltecido pelos golpistas. De acordo com a PGR, os membros da organização criminosa dirigiam ofensas ao general Freire Gomes, ex-comandante do Exército, e ao tenente-brigadeiro Baptista Júnior, ex-comandante da Aeronáutica, que foram contra a ruptura institucional. Já o chefe da Marinha foi tratado como "patriota". Garnier disse não saber por que tinha sido elogiado, mas citou que Baptista Júnior estava sendo acusado de "estar fechado em mordomias e vantagens antes de o governo terminar".
Como será o julgamento
Os réus são interrogados pelo ministro relator, Alexandre de Moraes. Depois, é a vez do procurador-geral da República, Paulo Gonet. Em seguida, as defesas dos outros réus podem questionar os depoentes.
Garnier foi o terceiro interrogado. Ontem, Moraes interrogou Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-chefe da Abin (Agência Brasileira de Inteligência).
Bolsonaro é o sexto da lista. A expectativa é que isso ocorra na quarta, mas há possibilidade, dado o ritmo do interrogatório de Ramagem, que o ex-presidente seja interrogado ainda hoje. Ele acompanhou as oitivas de Cid e do ex-chefe da Abin ontem.
Apenas Braga Netto vai ser ouvido de forma virtual. Ele está preso no Rio de Janeiro e vai acompanhar o processo por meio de videoconferência, e será o último a falar (veja a lista completa ao final).
Como foi o primeiro dia
Cid confirmou tentativa de golpe, mas negou participação. Ele disse que "presenciou grande parte dos fatos" e reforçou que não foi alvo de qualquer tipo de coação na delação.
Bolsonaro "recebeu e leu" a minuta do golpe, segundo Cid. O tenente-coronel disse que ele fez alterações no documento e "deu uma enxugada" para retirar a parte que pedia a prisão de autoridades, deixando somente Moraes.
Delator voltou a dizer que recebeu dinheiro em caixa de vinho. Cid afirmou que entregou ao major Rafael de Oliveira uma caixa de vinho com dinheiro a pedido do general Braga Netto. O montante seria destinado a bancar uma operação de golpe.
Ramagem itiu que não há provas de fraudes nas urnas. Ele argumentou que fazia anotações "privadas" sobre o assunto, mas não enviava ao então presidente Bolsonaro.
Moraes questionou se Ramagem usou a Abin para monitorar ministros do STF. "Nunca utilizei monitoramento algum pela Abin de qualquer autoridade", respondeu.
Momentos de Moraes renderam risos dos presentes ao longo da sessão. Até o final, quando o advogado do general Heleno pediu para a sessão começar mais tarde, após as 9h de amanhã, para ele "minimamente poder jantar", o ministro respondeu que sim, "às 9h02". O horário foi mantido.
Os réus que vão ser interrogados, na ordem:
Mauro Cid (ex-ajudante de ordens da Presidência e delator);
Alexandre Ramagem (ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência);
Almir Garnier (ex-comandante da Marinha);
Anderson Torres (ex-ministro da Justiça);
Augusto Heleno (ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional);
Jair Bolsonaro (ex-presidente da República);
Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa);
Walter Braga Netto (general da reserva e ex-ministro da Casa Civil).